A COLEÇÃO MAÇÔNICA ALEMÃ E OS MAIS DE 200 MIL LIVROS
Na revista Gênesis,
editada pela Grande Logia de España, ha uma história, traduzida livremente e
acrescentada de alguns comentários necessários.
Que aqui reproduzimos para fazer justiça aos perseguidos e
sacrificados Maçons alemães.
No início de 1934, logo após a ascensão de Adolf Hitler ao poder,
ficou claro que a maçonaria alemã corria o risco de desaparecer.
E breve, a maçonaria alemã, que conhecera dias gloriosos e que
tivera, em suas colunas, os mais ilustres filhos da pátria alemã, com Goethe,
Schiller e Lessingn, veria esmagado o espírito da liberdade sob o pretexto de
impor a ordem e uma estúpida supremacia racial.
Quanto retrocesso desde que Friedrich Wilhelm III, Rei da Prússia,
em 1822, impediu que os esbirros reacionários da Santa Aliança de Metternich
fechassem as Lojas Maçônicas, declarando peremtoriamente que poderia descrever
os Franco-maçons prussianos, com toda a honestidade, como sendo os melhores
dentre os seus súditos…
As Lojas alemãs, na terceira década do século XX, estavam
jurisdicionadas a onze Grande Lojas, divididas em duas tendências.
O primeiro grupo, de tendência humanista, seguindo os antigos
costumes ingleses, tinha como base a tolerância, valorizando o candidato por
seus méritos e não levando em consideração sua crença religiosa.
Constava de sete Grandes Lojas: Grande Loja de Hamburgo; Grande
Loja Nacional da Saxônia, em Dresden: Grande Loja do Sol, de Bayreuth; Grande
Loja-Mãe da União Eclética dos Franco-Maçons, em Frankfurt; Grande Loja Concórdia,
em Darmstadt; Grande Loja Corrente Fraternal Alemã, em Leipzig; e a Grande Loja
Simbólica da Alemanha.
O segundo grupo consistia das três antigas Lojas prussianas, que
faziam a exigência de que os candidatos fossem cristãos. Havia ainda a Grande
Loja União Maçônica do Sol Nascente, não considerada regular, mas que também
tinha tendências humanistas e pacifistas.
Voltando a 1934, a Grande Loja Alemã do Sol se deu conta do grave
perigo que iria enfrentar. Inevitavelmente, os maçons alemães estavam partindo
para a clandestinidade, devido à radicalização política e ao nacionalismo
exacerbado.
Muitos adormeceram e alguns romperam com a tradição, formando uma
espúria Franco-Maçonaria Nacional Alemã Cristã, sem qualquer conexão com o
restante da Franco-Maçonaria. Declaravam eles abandonarem a idéia da
universalidade maçônica e rejeitar a ideologia pacifista, que consideravam como
demonstração de fraqueza e como uma degeneração fisiológica contrária aos
interesses do estado!
Os maçons que persistiram em seus ideais precisaram encontrar um
novo meio de identificação que não o óbvio Esquadro e Compasso, seguramente um
risco de vida.
Há uma pequenina flor azul que é conhecida, em muitos idiomas,
pela mesma expressão: não-me-esqueças – o miosótis. Entenderam, nossos irmãos
alemães, que esse novo emblema não atrairia a atenção dos nazistas, então a
ponto de fechar-lhes as Lojas e confiscar-lhes as propriedades.
Vergissmeinnicht, em alemão; forget-me-not, em inglês;
forglemmigef em dinamarquês; ne m’oubliez pás, em francês;
non-ti-scordar-di-me, em italiano; não-te-esqueças-de-mim, em português.
Diz a lenda que Deus assim chamou a florzinha porque ela não
conseguia recorda-se do próprio nome. O nome miosótis (Myosotis palustris)
significa orelha de camundongo, por causa do formato das pétalas.
O folclore europeu atribui poderes mágicos ao miosótis, como o de
abrir as portas invisíveis dos tesouros do mundo. O tamanho reduzido das flores
parece sugerir que a humildade e a união estão acima dos interesses materiais,
porque é notada principalmente quando, em conjunto, forma buquês no jardim.
De acordo com uma velha tradição romântica alemã, o nome da flor
está relacionado às últimas palavras de um cavaleiro errante que, ao tentar
alcançar a flor para sua dama, caíra no rio, com sua pesada armadura e
afogara-se.
Outra história contada por ele diz que Adão, ao dar nomes às
plantas do Jardim do Éden, não viu a pequena flor azul. Mais tarde, percorrendo
o jardim para saber se os nomes tinham sido aceitos, chamou-as pelo nome. Elas
curvaram-se cortesmente e sussurravam sua aprovação. Mas uma voz delicada a
seus pés perguntou:
“- E eu, Adão, qual o meu nome?”
Impressionada com a beleza singela da flor e para compensar seu
esquecimento, Adão falou:
“ – Como eu me esqueci de você antes, digo que vou chama-la de
modo a nunca mais esquecê-la. Seu nome será não-te-esqueças-de-mim.”
Através de todo o período negro do nazismo, a pequenina flor azul
identificava um Irmão. Nas cidades e até mesmo nos campos de concentração, o
miosótis adornava a lapela daqueles que se recusavam a permitir que a Luz se
extinguisse.
O miosótis como símbolo foi objeto de um interessante estudo. Se
conta, também, que muitos maçons recolheram e guardaram zelosamente jóias,
paramentos e registros das Lojas, na esperança de dias melhores. O irmão Rudolf
Martin Kaiser, VM da Loja Leopold zur Treue, de Karlsruhe, quebrou a jóia do
Venerável Mestre em pequenos pedaços de tal modo que não pudesse ser
reconhecida pela infame Gestapo.
Em 1945, o nazismo, com seu credo de ódio, preconceito e opressão,
que exterminara, entre outros, também muitos maçons, era atirado no lixo da
História. Nas fileiras vitoriosas que ajudaram a derrotá-lo, estavam muitos
maçons – ingleses, americanos, franceses, dinamarqueses, tchecos, poloneses,
australianos, canadenses, neozelandeses e brasileiros. De monarcas, presidentes
e comandantes aos mais humildes pracinhas.
Mas, entre os alemães, alguns velhos maçons também sobreviveram,
seu sofrimento ajudando a redimir, de alguma forma, a memória da histeria
coletiva nazista. Eles eram o penhor da consciência alemã, a demonstração de
que a velha chama da civilização alemã continuara, embora com luz tênue, a
brilhar durante a barbárie.
Em 14 de junho de 1954, a Grande Loja O Sol (Zur Sonne) foi
reaberta, em Bayreuth, sob um ilustre irmão o Dr. Theo Vogel, núcleo da Grande
Loja Unida da Alemanha (VGLvD, AF&AM). Nesse momento, o miosótis foi
aprovado como emblema oficial da primeira convenção anual, realizada por
aqueles que conseguiram sobreviver aos anos amargos do obscurantismo. Nessa
convenção, a flor foi adotada, oficialmente, como um emblema Maçônico, em honra
àqueles valentes Irmãos que enfrentaram circunstâncias tão adversas.
Certamente, na platéia, estava o Venerável Mestre da Loja Leopold
ZurTreue, agora nº 151, ostentando orgulhoso sua jóia recuperada e
reconstituída, suas emendas de solda constituindo-se num testemunho mudo e
comovente da história.
Finalmente, para coroar, quando Grão-Mestres de todo o mundo
encontraram-se nos Estados Unidos, o Grão-Mestre da recém formada Grande Loja
Unida da Alemanha presenteou a todos os representantes das Grandes Jurisdições
ali presente com um pequeno miosótis para colocar na lapela.
O miosótis também é associado com as forças britânicas que
serviram na Alemanha, em especial na região do Rio Reno, logo após a guerra. Há
uma Loja, jurisdicionada à Grande Loja Unida da Inglaterra, a Forget-me-not
Lodge nº 9035, Ludgershall, Wiltshire, que adotou a flor como emblema. Foi
formada especialmente para receber os militares ingleses que retornavam do serviço
na Alemanha.
O uso do miosótis como identificação secreta pelos Maçons alemães
foi contestado, sem entretanto, apresentar os motivos da negativa.
Além disso, há anos que casas especializada em paramentos
maçônicos, exibem o miosótis em gravatas, alfinetes de lapela e pendantis, em
prata, ouro e bijuteria. Por que o fariam, se o miosótis não fosse importante?
Foi assim que essa mimosa florzinha azul, tão despretensiosa,
transformou-se num significativo emblema da Fraternidade – talvez hoje o mais
usado pelos maçons alemães.
Ainda hoje, na maioria das Lojas germânicas, o alfinete de lapela
com o miosótis é dado aos novos Mestres, ocasião em que se explica o seu
significado para que se perpetue uma história de honra e amor frente à
adversidade, um exemplo para as futuras gerações Maçônicas de todas as nações.
Na formação da Grande Loja unida da Alemanha aparecem 3 das
Grandes Lojas existentes antes da II Guerra Mundial: Grande Loja do Sol, em
Bayreuth; Grande Loja de Hamburgo; Grande Loja de Hesse, em Frankfurt (antiga
União Eclética); Grande Loja de Bremen; Grande Loja Unidade, em Baden-Baden;
Grande Loja Nacional de Niedercachse, em Hanover; Grande Loja Nacional de
Nordrhein-Westfalen, em Dusseldorf; Grande Loja Nacional de
Schleswing-Holstein, em Luberck; e Grande Loja de Wurttemberg-Baden, em
Stuttgart. De acordo com o List of Lodges, em 2001 contava com 14.000 irmãos
distribuídos em 490 Lojas.
A Maçonaria desenvolve-se nas Organizações Maçónicas tendo por
base a literatura que nela é produzida ou consultada.
Um conjunto vasto de obras maçónicas fazia parte do núcleo das
bibliotecas das lojas alemãs.
Segundo as estimativas do Museu Alemão da Maçonaria em Bayreuth,
esta literatura constituía o núcleo da investigação maçónica. Uma biblioteca
que crescia de forma exponencial. Em 1930, na Alemanha, a colecção maçónica
situar-se-ia nos 200.000 livros.
Este franco e interessante desenvolvimento foi abruptamente
interrompido quando Hitler chegou ao poder. Fecharam-se as Lojas maçónicas. A
sua propriedade foi confiscada. Bibliotecas de várias Lojas foram queimadas. A
GESTAPO chamou a si muitas dessas bibliotecas e material. Que foram
posteriormente entregues à Biblioteca profissional das SS, a Reichsfuhrer
Heinrich Himmler.
A guerra e os saques na Alemanha prejudicaram a Maçonaria. E quem
desejar aprofundar as informações aqui trazidas, recomendo a leitura de uma
actualização realizada e publicada na revista anual da Biblioteca da
Universidade na Alemanha.
No entanto, o Sr. Herbert Schneider, Director do Museu Maçónico
Alemão entre 1980 e 1996 e o Sr. Hans-Georg van Waveren Lesser, Director do
Museu Maçónico Alemão entre 1996 a 2002, dizem-nos que após terem consultado os
membros da Loja em 1933, houve por parte da Alemanha a compra de material
maçónico que iria servir de contrapropaganda.
Que após a formação do Reichssicherheitshauptamt (principal
gabinete de segurança) a biblioteca geral maçónica foi incorporada no
escritório VII (Reichssicherheitshauptamt Amt VII). E com a anexação da Áustria
na Grande Alemanha (o chamado “Anschluss”), as colecções maçónicas das Lojas da
Áustria encheram o caminho da pilhagem nazista.
Esclarece o professor Andrzej Karpowicz que o ano de 1940 foi
“próspero” na sucessiva pilhagem, pela rápida conquista de muitos dos países e
uma surpresa para muitos maçons das Lojas da Escandinávia e Europa Ocidental.
Este processo de pilhagem foi muito bem organizado.
Os nazistas saquearam, por exemplo, a Grande Loja da Holanda e a
Grande Loja da Noruega. Ocorreu o mesmo na Bélgica e em França.
Em França, depois da derrota inicial em 1940 os registos dos membros do Grande Oriente de França e da Grande Loja de França foram saqueados e muitos deles destruídos.
Em França, depois da derrota inicial em 1940 os registos dos membros do Grande Oriente de França e da Grande Loja de França foram saqueados e muitos deles destruídos.
A GESTAPO assumia temporariamente os edifícios das obediências
francesas. Os homens da Einsatzstab saquearam uma parte significativa dos
arquivos. Que depois entregavam a colaboradores, protegidos pelas SS a fim de
usarem esse material em propaganda anti-maçónica.
Havia dois centros em Paris. Um era liderado por Bernard Fay,
situado na Biblioteca Nacional e que exploravam os materiais roubados do acervo
do Grande Oriente de França. O outro chamava-se “Centre d’Action”, local
dirigido por Henri Coston e continha as colecções roubadas da Grande Loja da
França.
Mais tarde, estas colecções na Alemanha foram retiradas ou
evacuadas de vários locais onde se preservavam. Especialmente quando a Alemanha
começou a sofrer ataques aéreos das forças aliadas.
Para que se perceba o que ocorreu a tanta informação maçónica,
esclarece-se que a maior parte das colecções da Grande Loja da Holanda foram
descobertas pelas tropas americanas na Vila de Hirzenhain em 1946. Um oficial
americano que foi maçon ordenou às tropas que as reenviassem de volta. Várias
colecções de material maçónico disperso foram interceptadas por soldados
americanos e ingleses e enviadas para os Estados Unidos e para a Grã-Bretanha.
Mas as colecções de Berlin, parte da Boémia e de Wilkanóv foram
recolhidas pelo Exército Vermelho e declarados “despojos de guerra”, sendo
enviados para Moscovo. Apesar de haver ainda na Alemanha excelentes documentos.
A Universidade Livre de Berlin tem em seu poder alguns livros da
biblioteca da Grande Loja dos Três Globos em Berlim. Carregando ainda marcas da
prateleira da biblioteca Reichsfuhrer escrito a lápis.
Muitas destas colecções maçónicas estarão perdidas para sempre.
Colecções de músicas maçónicas foram também perdidas, reconhecendo-se que ainda
se conseguiram fazer prevalecer algumas das mais belas colecções e obras
poéticas. Recitadas ou lidas em ocasiões de diversos festivais maçónicos.
Por esse facto deixo aqui o meu apelo. Que cada maçon da Grande
Loja se esforce em fazer chegar ao Secretariado Permanente todo o tipo de
documentos que venha a produzir. Sejam eles documentos e obras sobre a ética,
sobre pensamento filosófico, traduções, posições, mesmo que sejam controversas.
Quer sobre credos, quer sobre fenómenos literários ou romanceados.
Todos eles são relevantes para que se consiga pelo menos repor o pensamento
humano.
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