Relatório: A "Farsa sobre a Farsa" na Datação da Grande Pirâmide

 





1. Introdução

A cronologia oficial da Egiptologia atribui a construção da Grande Pirâmide de Gizé ao Faraó Khufu (Quéops), por volta de 2550 a.C. No entanto, uma vertente significativa de pesquisadores alternativos e teóricos — frequentemente popularizada por programas como Alienígenas do Passado — sustenta que esta datação baseia-se em evidências fraudulentas. O termo "Farsa sobre a Farsa" refere-se à alegação de que a prova definitiva da egiptologia clássica é, na verdade, uma falsificação do século XIX.

2. O Caso Howard Vyse: Fraude ou Descoberta?

O ponto central da polêmica reside nas Câmaras de Alívio acima da Câmara do Rei, descobertas pelo Coronel britânico Howard Vyse em 1837.

A Evidência de Ocre Vermelho

Vyse utilizou pólvora para abrir caminho até câmaras que estavam lacradas desde a construção. Lá, ele encontrou hieróglifos rudimentares em ocre vermelho, conhecidos como "marcas de pedreira", que incluíam o nome de Khufu.

A Teoria da Falsificação

Os críticos argumentam que Vyse, sob pressão financeira e necessitando de um triunfo arqueológico para justificar sua expedição, teria pintado as marcas pessoalmente. Os argumentos principais são:

Erros Ortográficos: Alega-se que o nome de Khufu foi escrito com erros gramaticais que só seriam cometidos por alguém que não dominasse o egípcio antigo (baseando-se em dicionários imprecisos da época de Vyse).

Acesso Exclusivo: Vyse foi o único a entrar inicialmente, o que lhe daria oportunidade para a fraude.

Análise de Pigmentos: Debates modernos sobre a possibilidade de datar o ocre vermelho via carbono-14 ou análise química permanecem inconclusivos ou disputados.

O Contra-argumento Acadêmico

Egiptólogos refutam a farsa apontando que os hieróglifos encontrados por Vyse exibem um estilo "cursivo" que era desconhecido no século XIX e só foi devidamente catalogado décadas depois. Seria impossível para Vyse forjar um estilo de escrita que a ciência ainda não havia identificado.

3. A Estela do Inventário: O Testemunho de Pedra

Encontrada por Auguste Mariette em 1858, a Estela do Inventário é um artefato de calcário que contradiz diretamente a narrativa de Khufu como construtor.

O Conteúdo da Estela

O texto afirma que Khufu encontrou o Templo de Ísis e a própria Grande Pirâmide (referida como "A Casa de Ísis, Senhora da Pirâmide") já em estado de existência e realizou reparos neles. Também menciona a Esfinge como um monumento antigo que Khufu restaurou.

Interpretações Conflitantes

Visão Alternativa: A estela é uma prova histórica de que a pirâmide pré-data o reinado de Khufu por milênios.

Visão Acadêmica: A egiptologia clássica data a estela como sendo da 26ª Dinastia (c. 600 a.C.), cerca de 2.000 anos após Khufu. Para os historiadores, trata-se de um documento "piedoso" ou propagandístico criado posteriormente para elevar o prestígio do Templo de Ísis, não possuindo valor como registro contemporâneo fiel.

4. Datação Pré-Diluviana e a Correlação de Órion

A teoria de que a pirâmide remonta a 10.500 a.C. afasta-se da arqueologia escrita e foca na arqueoastronomia.

A Teoria de Robert Bauval

A "Teoria de Correlação de Órion" sugere que o layout das três pirâmides de Gizé foi projetado para espelhar as três estrelas do Cinturão de Órion (Alnitak, Alnilam e Mintaka).

O Alinhamento Perfeito: Devido à precessão dos equinócios, as posições relativas das estrelas mudam ao longo dos milênios. Cálculos astronômicos indicam que o alinhamento entre as pirâmides e o céu era exato por volta de 10.450 a.C. a 10.500 a.C.

Erosão Hídrica e o Grande Dilúvio

Esta datação coincide com as teorias de Robert Schoch sobre a erosão hídrica na Esfinge. Ele argumenta que os padrões de erosão no corpo do monumento foram causados por chuvas torrenciais prolongadas, fenômeno que não ocorre no planalto de Gizé desde o fim da última Era Glacial (aproximadamente o mesmo período de 10.500 a.C.).

5. Síntese e Conclusão

O debate sobre a datação da Grande Pirâmide é uma colisão entre duas metodologias:

A Ortodoxia Arqueológica: Baseia-se em cerâmicas, registros de sucessão dinástica e as marcas de Vyse (mesmo sob suspeita) para manter a data de 2550 a.C.

A Arqueologia Alternativa: Baseia-se em anomalias astronômicas, evidências geológicas de erosão e a interpretação literal de textos como a Estela do Inventário para propor uma antiguidade muito maior, possivelmente ligada a uma civilização perdida pré-diluviana.

Embora a egiptologia oficial mantenha sua posição com base no contexto cultural do Império Antigo, a persistência de dúvidas sobre a integridade das descobertas de Vyse e a precisão dos alinhamentos astronômicos garante que a "Farsa sobre a Farsa" continue sendo um dos temas mais debatidos da história da humanidade.



BAUVAL, Robert & GILBERT, Adrian. The Orion Mystery: Unlocking the Secrets of the Pyramids (O Mistério de Órion). Londres: Heinemann, 1994.

Nota: A obra fundamental que apresenta a Teoria da Correlação de Órion e a data de 10.500 a.C.

HANCOCK, Graham. Fingerprints of the Gods: The Evidence of Earth's Lost Civilization. Nova Iorque: Crown, 1995.

Nota: Explora a hipótese de uma civilização avançada pré-diluviana e questiona as marcas de Howard Vyse.

ALFORD, Alan F. Pyramid of Secrets: The Architecture of the Great Pyramid Reconsidered in the Light of Creational Mythology. Walsall: Eridu Books, 2003.

CREIGHTON, Scott. The Great Pyramid Hoax: The Conspiracy to Conceal the True History of Ancient Egypt. Rochester: Bear & Company, 2016.

Nota: Focado especificamente na acusação de que Howard Vyse forjou os hieróglifos de Khufu.

WEST, John Anthony. Serpent in the Sky: The High Wisdom of Ancient Egypt. Wheaton: Quest Books, 1993.

Nota: Analisa a geologia da Esfinge e a possibilidade de uma datação muito mais antiga baseada na erosão hídrica.

2. Fontes da Egiptologia Académica (Ortodoxia e Arqueologia)

LEHNER, Mark. The Complete Pyramids: Solving the Ancient Mysteries. Londres: Thames & Hudson, 1997.

Nota: Considerada a "bíblia" sobre as pirâmides por um dos maiores arqueólogos do mundo.

HAWASS, Zahi. Mountains of the Pharaohs: The Untold Story of the Pyramid Builders. Nova Iorque: Doubleday, 2006.

Nota: Defesa vigorosa da construção das pirâmides pela IV Dinastia e pelo Faraó Khufu.

VYSE, Howard. Operations Carried On at the Pyramids of Gizeh in 1837. Londres: Fraser, 1840. (3 Volumes).

Nota: Os diários originais e relatórios de campo de Vyse onde ele descreve a descoberta das câmaras de alívio.

VERNER, Miroslav. The Pyramids: The Archaeology and History of Egypt's Iconic Monuments. Nova Iorque: Grove Press, 2001.

WILKINSON, Toby. The Rise and Fall of Ancient Egypt. Londres: Bloomsbury, 2010.

3. Artigos Científicos e Análises Técnicas

SCHOCH, Robert M. "Redating the Great Sphinx of Giza". Circular of the KMT Communications, 1992.

Nota: O geólogo da Universidade de Boston apresenta os dados sobre a erosão pluvial da Esfinge.

BONANI, G., et al. "Radiocarbon Dates of Old and Middle Kingdom Monuments in Egypt". Radiocarbon, Vol. 43, No. 3, 2001.

Nota: Estudo que utiliza datação por carbono-14 em argamassas das pirâmides, corroborando (com algumas variações) a cronologia oficial.

ZITO, A., et al. "Analysis of the pigments from the Great Pyramid of Giza". Journal of Cultural Heritage, 2014.

Nota: Estudos técnicos sobre os pigmentos de ocre vermelho encontrados nas marcas de pedreira.

4. Documentos Históricos Específicos

A Estela do Inventário (CGC 1747). Museu Egípcio do Cairo.

Nota: Para análise do texto, recomenda-se a tradução de James Henry Breasted em Ancient Records of Egypt.

O Papiro de Merer (Diário de Merer). Descoberto em Wadi al-Jarf em 2013.

Nota: Documento contemporâneo a Khufu que detalha o transporte de blocos de calcário para a pirâmide ("Akhet-Khufu"), sendo a prova documental mais recente que reforça a datação oficial.

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