O Paradoxo de Banach-Tarski

 








O paradoxo de Banach-Tarski é um dos resultados mais surpreendentes e contraintuitivos da matemática do século XX. Descoberto em 1924 pelo matemático polonês Stefan Banach e seu colega Alfred Tarski, o paradoxo afirma que é possível decompor uma esfera em um número finito de pedaços não mensuráveis e, em seguida, reorganizar esses pedaços por meio de isometrias (rotações e translações) para formar duas cópias idênticas da esfera original, cada uma do mesmo tamanho que a primeira.

​A Essência do Paradoxo

​A base do paradoxo reside na interseção entre a teoria dos conjuntos e a geometria. A prova depende crucialmente do Axioma da Escolha, um princípio da matemática que, de forma simplificada, permite a seleção de um elemento de cada conjunto em uma coleção infinita de conjuntos não vazios, mesmo que não haja uma regra explícita para essa seleção. Este axioma, apesar de ser amplamente aceito na matemática moderna, leva a consequências estranhas como o paradoxo de Banach-Tarski.

​Os "pedaços" que compõem a decomposição da esfera não são as partes simples e bem-comportadas que estamos acostumados a ver na geometria euclidiana. Eles não têm volume no sentido usual da palavra (são não mensuráveis), o que torna impossível cortá-los na vida real. Em vez disso, são conjuntos de pontos tão complexos e intrincados que sua construção é puramente abstrata, existindo apenas no universo da matemática teórica.

​A prova de Banach e Tarski utiliza um grupo de rotações livres, um conceito algébrico que permite a criação de conjuntos de pontos que podem ser movidos de forma que suas cópias não se sobreponham. A estrutura desses conjuntos, juntamente com o Axioma da Escolha, permite a divisão da esfera em pedaços que podem ser "espalhados" e reagrupados para formar duas esferas inteiras.

​Cientistas com Ideias Semelhantes

​Embora o paradoxo de Banach-Tarski seja um dos mais famosos resultados sobre decomposições estranhas, outros matemáticos exploraram ideias similares. Um exemplo notável é o teorema de Hausdorff-Banach-Tarski, que é uma generalização do paradoxo original. Ele afirma que duas esferas (ou mesmo dois objetos tridimensionais, contanto que tenham volume) podem ser transformadas uma na outra usando um número finito de peças.

​Outro nome relevante é Felix Hausdorff, que em 1914 provou um resultado precursor conhecido como o paradoxo de Hausdorff. Ele mostrou que a esfera pode ser dividida em quatro partes de forma que uma delas, juntamente com uma das outras três partes, possa ser usada para formar uma nova esfera. O paradoxo de Banach-Tarski foi uma extensão do trabalho de Hausdorff, adicionando a capacidade de criar não apenas uma, mas duas cópias idênticas da esfera original.

​O trabalho de Hausdorff e Banach-Tarski é um reflexo das discussões sobre o papel do Axioma da Escolha na matemática. O matemático e filósofo Bertrand Russell era um defensor do axioma, enquanto outros, como Ernst Zermelo, foram os primeiros a formalizá-lo. A controvérsia em torno do axioma persiste, com alguns matemáticos questionando sua validade e investigando alternativas, embora a maioria o aceite devido aos resultados poderosos que ele possibilita, apesar das suas consequências surpreendentes.

​O Significado e as Consequências

​Apesar de sua natureza puramente teórica, o paradoxo de Banach-Tarski teve um impacto profundo na matemática, especialmente na área da teoria da medida e na geometria. Ele demonstrou que as noções intuitivas de volume e área não se aplicam a todos os conjuntos. Ele também sublinhou as estranhas, mas fascinantes, propriedades de espaços infinitos e a importância de axiomas aparentemente inofensivos. O paradoxo é uma prova de que a intuição geométrica que funciona para objetos simples falha em um nível mais profundo e abstrato.

​Em resumo, o paradoxo de Banach-Tarski não é uma falha na matemática, mas sim uma demonstração poderosa e contraintuitiva de como as regras do universo abstrato da teoria dos conjuntos podem divergir drasticamente do mundo físico que experimentamos. Ele é um lembrete da beleza, complexidade e às vezes do absurdo que pode ser encontrado na matemática.

​Bibliografia

​Wagon, Stanley. The Banach-Tarski Paradox. Cambridge University Press, 1985. (Esta é uma das referências mais abrangentes e acessíveis sobre o tema, detalhando a prova e as implicações).

​Banach, Stefan; Tarski, Alfred. "Sur la décomposition des ensembles de points en parties respectivement congruentes." Fundamenta Mathematicae, vol. 6, 1924, pp. 244-277. (O artigo original em que o paradoxo foi publicado, em francês).

​Hausdorff, Felix. Grundzüge der Mengenlehre. Verlag von Veit & Comp., 1914. (O trabalho original de Hausdorff que incluiu seu paradoxo, um precursor do trabalho de Banach e Tarski).

​Russell, Bertrand. Introduction to Mathematical Philosophy. George Allen & Unwin Ltd., 1919. (Uma fonte que discute a filosofia por trás do Axioma da Escolha).

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