O Manuscrito 512 é um dos documentos mais intrigantes e debatidos da história brasileira, sendo um dos pilares de um dos maiores mitos arqueológicos do país: a "Cidade Perdida da Bahia". Embora muitas fontes o datem do século XVII, estudos mais recentes indicam que o documento original é, na verdade, do século XVIII (1753), e foi encontrado pelo naturalista Manuel Ferreira Lagos em 1838, sendo depositado no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e, atualmente, está no acervo da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro.
A seguir, uma pesquisa aprofundada com todos os estudos a respeito do Manuscrito 512, abordando sua história, conteúdo, autenticidade e influência:
1. Contexto Histórico e Descoberta:
* Século XVIII e o Manuscrito Original: Contrariando a crença popular de que o manuscrito é do século XVII, a maioria dos estudos aponta que a "Relação histórica de uma oculta e grande povoação antiquíssima sem moradores" (Manuscrito 512) foi escrita em 1753. O documento narra a expedição de um grupo de bandeirantes ao interior da Bahia, em busca de minas de prata, onde teriam se deparado com ruínas de uma cidade antiga.
* Encontro e Depósito: O manuscrito foi encontrado pelo naturalista Manuel Ferreira Lagos em 1838 e levado ao IHGB. Sua localização atual é a Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, onde uma versão digitalizada está disponível para consulta.
* Autor Desconhecido: A identidade do autor do Manuscrito 512 permanece um mistério. Hipóteses foram levantadas por historiadores como Pedro Calmon, que sugeriu o mestre-de-campo João da Silva Guimarães, e Diomário Gervásio de Paula Filho, que cogitou o bandeirante Antônio Lourenço da Costa.
2. Conteúdo e Descrições da "Cidade Perdida":
O Manuscrito 512 descreve com detalhes uma cidade abandonada e suas edificações impressionantes:
* Muralhas e Entradas: O grupo encontrou gigantescos muros de pedra e uma única entrada formada por três arcos.
* Praça Central e Pilastra: No centro da cidade, havia uma praça com uma gigantesca pilastra de pedra negra com inscrições.
* Edifícios e Templos: Próximo à praça, um grande edifício de pedra, com a aparência de um templo sagrado, com obras de primor e figuras embutidas na pedra, cruzes de vários feitios e outros detalhes. As casas eram escuras no interior e sem telha, com tetos de ladrilho.
* Moedas e Inscrições: Em um dos edifícios, foi encontrada uma bolsa de moedas de ouro. Uma das faces da moeda tinha a figura de um "moço" ajoelhado, e a outra, um arco, uma coroa e uma seta. As moedas e inscrições nas ruínas eram em uma língua completamente desconhecida, com alguns caracteres semelhantes a letras gregas ou fenícias.
* Rio e Caverna: O relato menciona um rio caudaloso que cruzava a cidade e levava a uma cachoeira que desaguava nos rios Paraguaçu e Una. Posteriormente, outros aventureiros teriam encontrado, perto do Rio São Francisco, uma caverna com inscrições semelhantes às do manuscrito.
* Ausência de Moradores: A cidade estava totalmente abandonada, sem vestígios de presença humana, como se tivesse sido abandonada há séculos ou milênios.
3. Análise da Autenticidade e Estudos Históricos:
* Mito Arqueológico: O Manuscrito 512 é considerado o fundamento do maior mito arqueológico brasileiro. Desde sua descoberta, tem fascinado e intrigado pesquisadores.
* Ceticismo Acadêmico: A partir da década de 1870, a veracidade do relato começou a ser questionada por estudiosos acadêmicos, que passaram a vê-lo mais como uma obra de ficção ou um reflexo do contexto cultural da época.
* Interesse Contínuo: Apesar do ceticismo acadêmico, o manuscrito continua a ser objeto de considerável discussão por parte de pesquisadores amadores e pseudocientíficos, além de inspirar obras literárias e cinematográficas.
* Análise Paleográfica e Codicologia: Estudos sobre a escrita do manuscrito (paleografia) e sua estrutura física (codicologia) foram realizados para tentar determinar sua origem e características. A escrita humanística ou italiana, com traços cursivos e por vezes rebuscados, é uma característica notada.
* Contexto da Época: Alguns pesquisadores, como Wagner Ribeiro de Carvalho, sugerem que as descrições da cidade, com elementos como praças romanas, estátuas com coroa de louros e grandes pórticos, podem ter sido influenciadas pela efervescência clássica e as descobertas arqueológicas que ocorriam na Europa no início do século XVIII. Isso levaria a crer que o autor estava inserido em um contexto de "Antiguidade imaginária".
* Influência de Lendas: O Manuscrito 512 também se insere em uma tradição de lendas sobre cidades e minas perdidas no interior do Brasil, como a lenda do Eldorado e as "Minas de Prata" de Muribeca, que eram muito presentes no imaginário colonial.
4. Teorias sobre as Ruínas:
* Origem Misteriosa: As características arquitetônicas descritas no manuscrito, como o estilo das edificações e as inscrições, não se assemelham ao modelo urbanístico colonial português ou espanhol, o que alimenta diversas teorias.
* Civilizações Antigas: Algumas teorias sugerem que a cidade poderia ter sido construída por civilizações antigas, como egípcios ou vikings, devido a supostas semelhanças nas descrições arquitetônicas e nas inscrições.
* Misticismo e Pseudociência: O manuscrito tem sido associado a ideias de povos avançados perdidos na Amazônia e a especulações sobre a presença de gregos exilados, árabes ou chineses no Brasil antigo.
* "As Minas do Rei Salomão" e "As Minas de Prata": O Manuscrito 512 inspirou obras como "As Minas do Rei Salomão" de Rider Haggard (embora ambientada na África) e "As Minas de Prata" de José de Alencar, demonstrando seu impacto no imaginário popular e literário.
5. Influência na Arqueologia Brasileira:
* Busca pela Cidade Perdida: O Manuscrito 512 impulsionou diversas expedições e buscas pela "cidade perdida" ao longo dos séculos, transformando-se em um dos maiores enigmas da arqueologia brasileira. Notoriamente, o Coronel Percy Harrison Fawcett, um explorador britânico, se aventurou na busca por essa cidade (que ele chamava de "Z") e desapareceu em 1925, aumentando o misticismo em torno do Manuscrito 512.
* Formação da Identidade Nacional: No século XIX, em meio à construção e formação do Império, a busca por vestígios de culturas "superiores" ou civilizações antigas no Brasil, como as mencionadas no Manuscrito 512, era vista como uma forma de valorizar o passado nacional e construir uma identidade própria para o país, em comparação com as grandes civilizações pré-colombianas.
* Estudos Acadêmicos: Apesar de sua controvérsia, o Manuscrito 512 continua sendo um objeto de estudo para historiadores, arqueólogos e linguistas, que buscam entender seu contexto, sua autoria e sua influência na cultura e na historiografia brasileira.
Em resumo, o Manuscrito 512 é um documento fascinante que transita entre a história, a lenda e a ficção. Embora sua autenticidade como relato literal de uma cidade antiga seja amplamente questionada pela academia, seu valor como testemunho cultural do século XVIII, sua influência no imaginário popular e sua contribuição para o mito da "Cidade Perdida da Bahia" são inegáveis, tornando-o um objeto de estudo e fascínio contínuo na historiografia.

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