O planalto de Saqqara, necrópole da antiga cidade de Mênfis, no Egito, abriga uma vasta gama de monumentos funerários, desde as icônicas pirâmides de degraus até tumbas de mastaba ricamente decoradas. Entre essas estruturas milenares, o Serapeu se destaca como um local particularmente intrigante, especialmente por suas câmaras subterrâneas que contêm enormes sarcófagos monolíticos de basalto. O peso e a precisão desses recipientes funerários, aliados à aparente ausência de tecnologia capaz de produzi-los e transportá-los no período tradicionalmente aceito para sua construção, suscitam debates e teorias controversas que desafiam a cronologia oficial da história egípcia.
O Serapeu era um local de sepultamento dedicado ao culto do touro Ápis, considerado uma manifestação viva do deus Ptá. As evidências arqueológicas sugerem que o local foi utilizado desde a XVIII dinastia (cerca de 1550-1292 a.C.) até o período ptolemaico (305-30 a.C.). No entanto, a estrutura subterrânea que contém os sarcófagos de basalto maciço apresenta características que a distinguem das demais construções da região.
As câmaras subterrâneas, escavadas na rocha calcária, abrigam uma série de nichos, cada um destinado a conter um sarcófago. O mistério reside nas dimensões e no material desses sarcófagos. Fabricados em basalto, uma rocha extremamente dura e resistente, cada um deles pesa dezenas, senão centenas, de toneladas. Suas dimensões internas são surpreendentemente precisas, com cantos retos e superfícies polidas com uma exatidão que seria difícil de alcançar mesmo com a tecnologia moderna. As tampas, também de basalto, encaixam-se com uma precisão milimétrica, selando os recipientes de forma quase hermética.
A questão central que gera controvérsia é como uma civilização supostamente desprovida de ferramentas de ferro ou aço, máquinas de elevação sofisticadas e conhecimento avançado de geometria e lapidação de pedras duras poderia ter realizado tal feito. A narrativa histórica convencional atribui a construção dessas tumbas e sarcófagos ao Novo Reino (cerca de 1550-1070 a.C.) e ao período ptolemaico. No entanto, muitos pesquisadores e entusiastas questionam essa cronologia, argumentando que a tecnologia necessária para tal empreendimento não existia na época.
Estudos e Literatura Pertinente:
* Auguste Mariette: O arqueólogo francês que descobriu o Serapeu em meados do século XIX documentou a presença dos sarcófagos, mas não ofereceu uma explicação definitiva sobre sua construção. Sua obra "Le Sérapeum de Memphis" (1882) é uma fonte primária essencial, embora focada mais na descrição e nos achados do que na tecnologia de construção.
* Christopher Dunn: Em seu livro "The Giza Power Plant: Technologies of Ancient Egypt" (1998), Dunn analisa a precisão dos sarcófagos do Serapeu sob uma perspectiva de engenharia, argumentando que as marcas encontradas sugerem o uso de ferramentas rotativas e técnicas de usinagem avançadas, incompatíveis com a tecnologia conhecida do antigo Egito.
* Graham Hancock e Robert Bauval: Em "The Message of the Sphinx" (1996) e outras obras, esses autores exploram a possibilidade de uma civilização mais antiga e tecnologicamente avançada ter existido no Egito, sugerindo que estruturas como o Serapeu poderiam ser legados dessa era perdida.
* Pesquisas e análises de Andrew Bayuk: Bayuk, um pesquisador independente, realizou medições detalhadas dos sarcófagos, destacando a precisão das dimensões e dos ângulos, reforçando a ideia de uma manufatura que exigiria ferramentas e técnicas sofisticadas. Seus trabalhos podem ser encontrados em diversas plataformas online e apresentações.
* Teorias de "Out of Place Artifacts" (OOPArts): Embora não sejam estritamente acadêmicas, diversas teorias dentro do campo dos OOPArts mencionam os sarcófagos do Serapeu como evidências de tecnologia avançada em tempos remotos. É importante abordar essas teorias com um olhar crítico, separando a especulação da análise baseada em evidências.
Controvérsias e Debates:
As principais controvérsias em torno do Serapeu e seus sarcófagos giram em torno de:
* A datação da construção: A cronologia oficial é baseada principalmente em inscrições e associações contextuais com o culto de Ápis. Críticos argumentam que essas associações não provam a data de construção dos sarcófagos em si, que poderiam ser muito mais antigos e reutilizados para os enterros dos touros sagrados.
* A tecnologia utilizada: A ausência aparente de ferramentas e técnicas capazes de produzir tais objetos com a precisão observada é um ponto central. Como os antigos egípcios, com suas ferramentas de cobre e pedra, poderiam cortar, perfurar e polir basalto com tamanha exatidão? Como transportaram blocos de pedra tão massivos por consideráveis distâncias?
* O propósito original: Se a construção demandou um nível tecnológico tão elevado, qual era o propósito original desses sarcófagos? Estavam realmente destinados aos touros Ápis, ou teriam tido outra função para uma civilização anterior? Alguns sugerem que poderiam ter sido recipientes de energia ou parte de alguma tecnologia desconhecida.
É crucial notar que a egiptologia mainstream geralmente atribui a construção à engenhosidade e ao trabalho árduo dos antigos egípcios, dentro do contexto tecnológico conhecido para o período. Explicações como o uso de rampas, alavancas, trenós e ferramentas abrasivas, juntamente com um grande contingente de mão de obra, são frequentemente apresentadas. No entanto, essas explicações nem sempre conseguem responder satisfatoriamente à precisão milimétrica e ao material extremamente duro dos sarcófagos.
Conclusão:
O Serapeu de Saqqara, com suas câmaras subterrâneas e os colossais sarcófagos de basalto, permanece um testemunho silencioso de habilidades e conhecimentos que desafiam nossa compreensão da tecnologia do antigo Egito. Embora a egiptologia tradicional ofereça explicações dentro do quadro cronológico estabelecido, as características singulares dessas tumbas continuam a alimentar debates e a inspirar teorias alternativas. A investigação aprofundada, aliada a novas tecnologias de análise e datação, poderá, no futuro, lançar mais luz sobre os mistérios que envolvem essas impressionantes construções e o verdadeiro nível de sofisticação das civilizações que as criaram. A literatura existente, desde os relatos dos primeiros descobridores até as análises de engenheiros e as especulações de pesquisadores independentes, oferece um panorama fascinante sobre um dos enigmas mais persistentes da ar
queologia egípcia.




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